A LINGUAGEM DO AMOR


(dedicado ao meu amigo DELEGADO RUBENS RECALCATTI)



O MELHOR


Estamos tentando... As alças do amor são vôos realizados, vôos que se completaram, são arcos inscritos na superfície azul do céu, com mensagens de eternidade. Há por visto declarado, subo até os desvãos desse monte, as pedras agora abrigam outras idéias. Anuncio o meu bem estar ...

“ Isso, meu querido amigo, não é uma transferência amorosa... não, não é, mas... é uma compensação amorosa, na falta de homens bons e sinceros como você no mercado... então, é um exercício livre e apaixonado da relação homem e mulher, desde o seu princípio..., um exercício liberto de censura, no campo restrito das palavras e pensamentos e sentimentos entregues e dados, dados por dar... na falta de homens reais e orientados para o amor, o amor de uma mulher, exercito todos os dias esse episódio de um romance... eu me declaro sucintamente todas as manhãs, ao chamá-lo meu amigo. Como precisa ser todo exercício, incansavelmente me entrego a essa aquiescência renovadora até se apagarem as imperfeições dos outros homens.... Beijo seus olhos com todo o meu respeito. E tenha paciência e piedade de mim... por enquanto. Compaixão. Querido AMIGO.”

Continuamos, por enquanto, a linguagem do amor. Ao menos por enquanto tentamos. Tentamos o melhor. Tentamos determinar na esfera das coisas incompreensíveis aos nossos olhos, o que nos pertence, e o resto, manipulamos e estabelecemos critérios de julgamento, seleção, etc. e tal. O superego é uma lei desprovida de sentido... Para as nossas ações existe uma lógica e um movimento... Manipulação diz bem o que vem regrar certas condições, certos precípuos.
Quando não te encontram..., procuram por outros. Ha uma variedade de outros neste primeiro contato, no entusiasmo de meditar sobre essa face do destino, encontro o temor desta mão tocar uma verdade irreconhecível... Tangível na transformação das faces, na válvula da fascinação, no escândalo do desejo. Mas as sobras, as sobras de ontem, as falsas indicações, nos levavam a incerteza desse sentimento... e se despedir, antes de ter sentido o êxito do beijo apaixonado, declarado. Os outros atestados são o que a procura alcança, por isso alça, com o peso do que ficou, uma sublime perseverança.
O não acabado nos lança de novo. Repetindo e retomando um ciclo, movimentando a engrenagem. A linguagem do amor estabelece uma cria, um criptograma móvel, identifica ao parceiro, veicula sua condição. Nos aproxima da imagem necessária ao amor... cabe-nos dizer, é onde a linguagem nos leva. Indica esta imagem criada, o lugar do ser. Onde todas as transformações e ensaios são possíveis.
Uma película de tão fina espessura que chega a ser transparente, tal sua delicadeza. Esta página, este refino de uma carta, onde entregamos ao outro um apelo, um apego, uma mazela desta fatia doce ou acre de um sentimento... rodamos essa película e já estamos dentro da produção de um sentido, já estamos feito a face de uma história, um romance. Porque queremos amar, ou porque nos recusamos a amar.
A Declaração de Amor esta impressa. Estamos apaixonados um pelo outro, a virtualidade desse outro, a e.mail imagem do outro. O imput, como diziam alguns psicólogos naquela época... Neste acesso ao outro, o computador nos imputa. A imagem virtual, os óculos e as lentes, o estigma e a referência.
“Com efeito, o sujeito virtual, reflexo do mítico, quer dizer, o outro que somos, está lá onde vimos inicialmente nosso ego – fora de nós, na forma humana. Essa forma esta fora de nós, não enquanto feita para captar um comportamento sexual, mas enquanto fundamentalmente ligada a impotência primitiva do ser humano. O ser humano não vê sua forma realizada, total, a miragem de si mesmo, a não ser fora de si. Essa noção não figura ainda no artigo que estudamos, só surge mais tarde na obra de Freud.
Aquilo que o sujeito, que existe, vê no espelho, é uma imagem, nítida ou bastante fragmentada, inconsistente, descompletada. Isso depende da sua posição em relação a imagem real. Muito nas bordas, vê-se mal. Tudo depende da incidência particular do espelho. É só no cone que se pode ter uma imagem nítida.” (LACAN, Jacques. O SEMINARIO – Livro 1: Os escritos técnicos de Freud. – A Tópica do Imaginário. Ideal do EU e EU-Ideal. Pg. 164.)

TOPICO I: A INTERNET E O PRAZER DE OLHAR


“Jamais me olhas lá de onde eu te vejo.” (J. Lacan). Chegamos nessa fissura contratual, a Internet. A internet e o voyeurismo. E é um aceno prático, abrir a Internet, a página do Orkut, ou outras páginas, um visto para a navegação. Somos internautas... vasculhamos os cantos, encontramos palavras e créditos, opções e formas de manuseio. Esporadicamente, encontramos conceitos. Focamos o centro ótico numa determinada labareda de precisão, corremos a alcançá-la, e logo ela se desfaz, e retornamos ao início. Uma bela Constância , seja sim um nome de mulher, uma bela Constância é procurada nesse evento da internet.
Ao que me declaro, o amor seja dado. Assim, os dados do programa sejam auferidos da homeostase própria a toda identificação imaginária. Para onde essa imagem nos transporta, e de onde nós retornamos. Um espaço lúdico e não empírico, sabemos tratar o homem a nossa imagem e condição? Não ser visto, não ser jamais sentido, este é o paradigma inevitável ao internauta. No espaço da representação, no chamuscar da imagem, no estampido da percepção. Isso bole comigo, isso me mostra...., me mostra na medida em que me revelo.
O campo da visão, o campo da percepção, não é o mesmo que dizer, o campo do pensamento... Por essa razão, a Internet esta tão propensa a causar essa erupção de uma fantasia, de uma nostalgia por assim dizer. Uma nostalgia de que algo possa ser entregue a este sujeito que navega nesses mares... falta-lhe contudo, a bússola desse passado imediato. Quanto mais o sujeito se encontra na despensa de sua reserva inconsciente, sem o sabê-lo, mais ele é revelado e entregue como carne aos lobos que são os seus próprios fantasmas.... Dar-me ao ver.
Freud escreveu um texto, um diagrama por assim dizer, que fala sobre a pulsão escópica, em 1928 ele publicou esse texto chamado “FETICHISMO”. “Freud escreveu que nenhuma outra variação do instinto sexual que se aproxima do patológico pode reivindicar tanto nosso interesse quanto esta, e, na realidade, não poucas vezes retornou a sua consideração. Nessa primeira descrição, ele não vai muito além de sustentar que ‘a escolha de um fetiche constitui um efeito posterior de alguma impressão sexual, via de regra na primeira infância’ (.....)”. O transsexualismo, o homossexualismo, a pedofilia, são variações dessa pulsão, são correlatos de fantasias e a tentativa de produção de um significado. Produção de um significado que nunca é levado a contento porque serve apenas para restaurar essa identificação imaginária, subsidiária de uma defesa por parte do sujeito em questão... Compreenda-se então que a identificação imaginária do sujeito subdivide-se na realidade, ganha consistência a partir dos vários outros egos, que estão ai implicados nessa mesma realidade, como pontos de acesso, como válvulas de escape para sanar uma divida provisória. Divida essa que é sempre reintroduzida nesse mundo fantástico do suposto perverso.
Tudo aquilo que é rejeitado pelo sujeito, reaparece no real... Os psiquiatras, agora vou entrar numa área de conflito metódico, os psiquiatras brincam e manipulam bastante suas fórmulas em razão disso, ou seja, desse conceito espetacular, colocado ai, nas Universidades e colocado ai também, nos Hospitais Psiquiátricos, o famoso conceito de Projeção. Palavra essa que sai aos borbotões da boca dos psiquiatras quando ainda não descobriram as razões da loucura, eles dizem: o sujeito está projetando, trata-se de uma projeção maciça. Quando escuto isso da boca dos psiquiatras, isso me cheira a bosta. Porque é mesmo uma bosta o que eles fazem.
Estamos aqui adentrando no campo espetacular das Alucinações verbais, auditivas, os delírios propriamente ditos. Antes disso, queria sublinhar aqui um texto de Jacques Lacan, “O mimetismo”: “Alguns só querem ver, no registro das colorações, fatos de adaptação diversamente conseguida. Mas os fatos demonstram que quase nada da ordem da adaptação – tal como ela é vista ordinariamente como ligada as necessidades da sobrevivência – quase nada disso esta implicado no mimetismo, o qual, na maioria dos casos, se mostra seja inoperante, seja operante estritamente em sentido contrario do que quereria o resultado presumidamente adaptativo. Em contraposição, Caillois põe em relevo as três rubricas que são efetivamente as dimensões maiores em que se desenrola a atividade mimética – o travesti, a camuflagem, a intimidação.
E neste domínio, com efeito, que se apresenta a dimensão pela qual o sujeito tem como inserir-se no quadro. O mimetismo da a ver algo enquanto distinto do que poderíamos chamar um ele-mesmo que esta por trás. O efeito do mimetismo é camuflagem, no sentido propriamente técnico. Não se trata de se colocar em acordo com o fundo, mas sobre um fundo sarapintado, fazer-se pinta – exatamente como se opera a técnica da camuflagem nas operações de guerra humana.
Quando se trata do travesti, uma certa finalidade sexual é visada. A natureza nos mostra que essa visada sexual se produz por toda sorte de efeitos que são essencialmente de disfarce, de mascarada. Aqui se constitui um plano distinto da visada sexual em si mesma, que ai se encontra representando um papel essencial e que não deve se distinguida tão depressa como sendo o da tapeação. A função do logro, nessa ocasião, é outra coisa, diante da qual convém suspender as decisões de nosso espírito antes de ter bem medido sua incidência.
Enfim o fenômeno dito da intimidação comporta, também ele, essa sobrevalia que o sujeito tenta sempre atingir em sua aparência. Ai também, convém não se apressar em por em jogo uma intersubjetividade. Cada vez que se trata da imitação, guardemo-nos de pensar depressa demais no outro que seria assim dito imitado. Imitar, e sem duvida reproduzir uma imagem. Mas fundamentalmente é, para o sujeito, inserir-se numa função cujo exercício o apreende. E nisso que devemos provisoriamente parar.” (O Seminário – Livro 11. Os quatro conceitos fundamentais da Psicanálise).
Então, intimidação, conceito que iremos percorrer dia a dia quanto a Internet, quanto a sua utilização e manipulação. A presença de um comando nasce antes do aparecimento da Internet, este comando faz parte de qualquer integração de elementos, no que diz respeito a informática, ao programa. Nenhuma tecnologia é feita para acomodar o sujeito ao seu meio, a tecnologia tenta reinventar o modo do gozo desse sujeito. A sucessão, a aproximação e a repetição de estímulos, constantemente e ininterruptamente , criam uma barreira defensiva , antes mesmo que o sujeito tenha percebido e formado um pensamento... Então meus senhores, essa dimensão contratual vai bem além do que podemos imaginar, no sentido apenas de uma ferramenta tecnológica que nos liga ao mundo e as pessoas ... Essa cadeia cognitiva, essa rede mundial, tem outros elementos e outras conotações...
A primeira ilusão é querer debater esse elemento, a Internet, como sendo um mecanismo alheio ao sujeito. Escutei pessoas falando e se referindo a Internet como sendo um veículo de duas mãos, que está dentro de nossas casas, e nos convivemos com o inimigo 24 horas por dia.... etc. e tal.... A Internet não é um aparelho de comunicação, feito o rádio e a televisão... , também não é uma máquina de lavar roupa ou um micro ondas. A Internet está bem mais próxima de um elemento idéico, uma estrutura funcional como o é o Ego para toda a Psicologia. E ai, quando fazem a leitura do Ego, do Id e do Superego, interpretam essa razão como uma figura exterior.... A Internet nasceu e foi produzida em razão desse contexto mundial, portanto, a Internet é um efeito lógico, como toda condicional, supre uma função.
A Internet apareceu justamente no momento , nada ao acaso. Ela faz a supressão de um elemento, pega esse elemento e estabelece um critério de relação entre pessoas. Pode ser uma espécie de barreira de estímulos, ou algo assim, é nesse sentido que a Internet está ai, e não como uma ferramenta tecnológica a serviço das pessoas... Essa é a primeira ilusão, tal qual a consciência o era para todo o trabalho e descoberta do doutor Freud. Quando o doutor Freud disse que a Psicanálise não era uma ciência e nem estava a serviço da Psicologia e que nasceu de uma relação entre médico e paciente, é nesse sentido que eu entendo o aparecimento da Internet. Existe um modo contratual, e uma forma particular de inter relação. Podemos entender assim enquanto um sintoma sócio-cultural. Um sintoma sócio-cultural que busca a supressão de um elemento de oposição. Um elemento contraditório.
Escutei algumas pessoas dizendo que na Internet as pessoas querem aparecer, e, por que essa necessidade de se mostrar?!... Outra ilusão. Se existe uma coisa que as pessoas não fazem na Internet é se mostrarem. Esse dado a ver, essa figura mítica que é a imagem de si e a imagem do outro, são efeitos de ilusão, são jogos possíveis nesse anteparo virtual. Esse anteparo virtual por si só já impede que a pessoa apareça. O que está sendo percebido na Internet e que cria essa ilusão, é a forma do posicionamento desse elemento idéico que causa essa sensação de ver alguma coisa a mais do que no modo real de aparição do sujeito. Por isso também a perversão, os sites de pornografia, pedofilia , etc. Justamente pela razão de não conseguirem mostrar o que querem mostrar, pelo simples fato de que não existe essa aparência ideal, sucumbem a representação de um espaço.
A INTERNET jamais vai poder ser criativa, ao modo de um quadro, de uma pintura, porque trabalha a margem de um extrato forjado do ser humano, não é possível a Internet fazer essa transposição, do espírito a matéria e vice-versa. Aqueles que se agrupam e navegam na Internet, a maioria provoca essa força de empuxo, correlato de um espaço e intervalo, de um comando. As ondas e o mar... Soçobrar, o sentido que ela causa não é também o sentido que nos causa um enigma. O cansaço virtual de alguns pode falar melhor sobre os seus efeitos: as vezes é melhor soçobrar essa intenção, menos pior.

E, a LINGUAGEM DO AMOR nos declara . Essa declaração de Amor, tal qual a Declaração dos Direitos Humanos me faz uma separadora de águas. Por enquanto, ao menos um pouco.



Denise França.

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