EU, SOZINHA DE TUDO


Eu, sozinha de tudo, sozinha de resto. Me empresta a caminhada, já digo que a estrada percorrida foi. Se os outros mudam nosso caminho, posso dizer, alteram nossa resposta. Faço pensar por algum tipo de vida verdadeira, quando deixam na beirada depositado, depois de tudo terem feito e assomado nosso desgosto. Terem o prazer de ver nossos olhos úmidos, a lágrima derradeira, e o vinco da desgraça.
Essas almas sem espírito, esses vasos de vinagre, todos eles cheios até o bojo, a sombra mesma do homem , a gargalhada do fantoche sem rosto, esse solilóquio aberto e sem verdade que atiça toda a maldade, toda a crueldade, a desvalia do segmento desta cruz, a insensatez daquele que profana a vida.
A preguiça desses olhos sem fundo não enxerga, sequer reflete a luz. Não se aproximam do largo sorriso da amizade e nem da quentura do beijo apaixonado. Não tem as asas da criatividade. E vivem da imitação de um sentimento, porque mal sabem do amor . Vazios e tolos, imbecis e arrogantes, sórdidos e mesquinhos, egoístas e sem pátria, tal são os ídolos da fofoca e da inveja.
Sozinha de tudo, sozinha de resto.... As histórias são contadas, reflito a procedência, aparento descaso, encontro o personagem, um sentimento vai nascendo, do improviso vejo escutar o meu coração o caminho da história, por onde anda a vida de um ser humano. A brotação de um sentido, quando a aparência que vai entrando pela vista, encontra um modo de ficar, uma ruela de encontro.
Me arrebata a alma, o brilho dos teus olhos quando percebo neles a razão da tua procura... me arrebata a alma, essa clara criatura que nasce como resposta. Se todos soubessem, a vida a cada instante feito um milagre, se peita no provento dessa chama universal, a emoção no corpo da palavra, no ato realizado, na oportunidade criada.
Onde nasce os olhos de amanhã, senão naquela mesma planície... andando até o alto da montanha, a caminhada sozinha, a caminhada sempre sozinha, nesse particular do cuidado do compromisso firmado. Na caminhada carece o espírito desembainhado, no solilóquio a escutar o tropeço do peito...
No solado do pé já vão os ladrilhos da estrada, olha o pó no arrasto da estrada, qualquer possível neste terreno é mesmo a permanência e a persistência que faz. Faço ficar de vez ou para nunca mais o meu sorriso neste instante de uma tranqüila vontade em tua vida. Ai eu sinto, meu espírito tem paradeiro, tem a cobertura de uma sombra na quentura do sol, refresco de água, quando a sede me brota.
Continuo indo pela necessidade do movimento desta hora, chamada o paradeiro, a vida. Mas o meu ponteiro encontra o teu destino, quase sempre acontecendo naquele momento, o quase instante de ficar um pouco mais, e se estendendo nessa espera, do não sei o que, no virado da hora, encontrar o teu sorriso, lembrar ao te ver, essa primeira vez, o mais parecido de uma passagem do destino: tua imagem relembrada no apagado da indecisão, no apagado da memória.

Chegamos ao mesmo tempo, essa guia que me tranqüiliza na dificuldade da hora, o sentimento vai delimitando seus modos, vencendo a aspereza da inquietude, tornando sensível o incerto. Por isso precisa da outra mão, precisa se materializar nos olhos do outro, no gesto de aproximação, na boca beijada.
O outro pergunta no mesmo lugar da memória, o significado e o sentido. Ir de encontro a essa querência, lá onde impele a uma vontade maior, de encontrar os olhos, de procurar as mãos, querer e imaginar.
Sozinha de tudo, sozinha de resto, para saber onde está o descaminho onde a inveja é criada. Qual a separação maior, a do homem ou a de Deus. O resultado de esperar tanto tempo, e depois de tanto tempo, ainda assim, ver ninguém. Ver ninguém chegando, depois de tanta saudade, ver o rio se movendo, tudo indo, passando depois de ficar.
Como a chuva que termina de cair, a varredura do chão pelas águas. Continuo a caminhada, descobrindo e descortinando os arredores. A graça dos espíritos puros, o desconforto dos olhos que desconhecem o meu coração.
Vai meu bem querer, o amado mesmo, de todos o sempre próximo por aquele o meu peito querer matar a saudade. Depois de tanto passar, saber de que modo se nomeia a verdade e onde ela principia. E se acaba, onde a semelhança com uma parte de imaginação, onde a fantasia era crédito de futuro, onde mesmo essa forma do amado eterno se perdeu...
Em tantos outros, pode o mesmo beijo devolver a presença do amor por desatino? Acordo, acrescento ao pensamento as novidades, o cheiro de café, a água morna, o doce de abóbora, o aparentado familiar, lá bem longe o modo igual de servir a notícia, de principiar o dia. O espírito sobre o espírito, a sensação de pertencer ao dono do amor por um voto qualquer de compromisso.
Estou devolvendo o mesmo amor. Beijar os teus lábios, servir ao teu costume. Sentir o teu primeiro olhar desde onde a feitura do teu silêncio junto a esse caminho em mim, percorrendo o teu chão. No sentido de viver, o sentido de ficar. A permanência de um jeito de ser, único, inconfundível, para sempre. Transformar as paredes e ruelas do sentimento. Por que o ser humano fabrica tanta derrota? Não produz a novidade, não abre os olhos e enxerga o caminho do amor?
Meu corpo sente o contato da graça, do vento, da tua passagem beirando minha pele como um toque. Meu corpo sabe a beirada da tua vontade, descobre a madrugada, sente onde é o teu começo e o teu fim. O teu corpo e o meu juntos, tem cantos, precipícios, substância, calor e resgate.
Permanência de todos os amores na estrada, a lembrança aquieta a dor da saudade, da desilusão, aquieta e vai se amoldando num possível, todos gravados na memória, tem significado e um nome. Qualquer um que vai, que provoca a desistência dentro do teu sorriso, do teu querer, é mais então quando me sobra esse resto e eu posso dizer que te amo amado, mesmo não alcançando a tua mão aberta, sequer ela estando repousada sobre o meu colo. Eu te dou o mesmo amor, por recusa dos outros, o mesmo amor te devolvo e entrego com o meu sorriso que brota feito eu te devolver depois do adeus, o gosto do beijo, te puxar para junto do meu corpo e te abraçar, e desejar naquele instante ou momento que faltou, toda a vontade como se um dia eu estivesse deitada no chão desta procura e você tornasse a olhar mais uma vez, onde teu desejo se completou no meu corpo. Se realizou na minha vontade.


Denise França.

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