A COMPOSIÇÃO DO BEIJO (17) - DENISE FRANÇA

Curitiba, 21 de julho de 2012.

"ENSAIO DE LUZES" (FICÇÃO): TEXTO DEDICADO AO DOUTOR FLÁVIO GIKOVATE.

INSPIRAÇÃO DÉCIMA SÉTIMA: AMARELO OURO.

Eu não era sedutora, era real. Os acontecimentos ao lado de Gikovate eram vividos,  não mascaravam uma realidade inexistente. Não desejava mostrar a ele  um sonho impossível, nem uma paixão avassaladora, fabricar o inominável... Chegava até ele todas as vezes como pessoa humana, e via um homem ali presente. Sabia se tratar de um homem público, mas eu o enxergava sem essa arrogância. Era o homem que me produzia  as sensações e os sentimentos, a deriva do meu querer e não a sua posição ou status.
Nem mesmo saberia dizer se retornaria um novo momento, porque  eu não programava  ter a presença dele ao meu lado, mas viver a presença dele enquanto fosse possível. 
A minha vida não precisava dele, e vice-versa. Não me sentia enfraquecida e nem sufocada, não sentia o medo de perdê-lo. 
A alegria em recebê-lo todas  as vezes permanecia em mim. Eu abria a porta, e seus olhos fixos aos meus, compreendendo e possibilitando que aquele espaço se tornasse o nosso espaço naquele momento, só isso. Não haviam regras de permanência nem de saída. 
Nosso encontro algumas vezes foi imediato, nem por isso nos sentimos frustrados. 
Nesses encontros ele me recebia, me puxava ao fundo, longe de olhares, de perguntas, e me beijava, abraçava, e eu sentia o significado que me era dado, entregue.  
Gikovate não precisava me explicar sua conduta, nem sua prática diária. Da mesma forma eu não sentia necessidade de prover a distância, com resíduos de fatos.
A natureza do amor vêm do bem-estar que a companhia do outro nos proporciona. O sentimento surge e expande seus horizontes em razão das coisas vividas, diárias, concretas, reais.
A sensação de bem-estar assim como o prazer na expressão do carinho da outra pessoa, acontece em razão desta permissão e franquia de liberdade e respeito.
Não posso viver o amor por um homem, se o meu descobrimento como mulher, se sentir travado, impedido, desmotivado. Porque sei que eu enquanto mulher, para ser, preciso e quero a diferença, através da figura do homem em sua complexidade, pensamento, sentimento, prazer, espírito. As relações de competição, de rivalidade, não tem e nunca tiveram espaço em minha vida, não fazem parte do meu pensamento e das coisas que acredito.
A dimensão da vida,  assim se torna fecunda. Gikovate me proporcionava este espaço de criatividade e produção, porque conversávamos muito.
O ser é uma construção do espírito. Eu penso que a dificuldade das pessoas, e o grande apego ao dinheiro, e tudo o que representa status,  se dá em razão da falta de espaço para a expressão humana, para a criação, para a observação, elaboração de um  pensamento acerca da realidade própria e outras realidades.
Gikovate tinha a noção do ser-humano, de si próprio, de suas capacidades, e sabia que isso era essencial a qualquer possibilidade de transformação social.


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