A COMPOSIÇÃO DO BEIJO (03) - DENISE FRANÇA

Curitiba, 15 de junho de 2012.

"ENSAIO DE LUZES" (FICÇÃO): DEDICADO AO DOUTOR FLAVIO GIKOVATE.

INSPIRAÇÃO TERCEIRA: CARMIM


GIKOVATE fechou a porta, eu me sentei em frente aquela pequena lareira, acabava de me conformar ao frio de a pouco... Olhei a estante de livros, me levantei, aproveitei o momento em que ele fôra até a cozinha, para retirar um dos seus livros, e abri-lo. Descalçei os sapatos, e andava através daquele espaço, lendo algumas passagens ao acaso.
GIKOVATE retornou, trazendo nas mãos uma taça de vinho, estendeu a taça em minha direção, e depositou-a em cima da mesinha, deixando-a ali a meu critério. Neste momento, não sei porquê, parecia que ele se detivera em outros pensamentos além daquele espaço, como se repentinamente lembrasse de um compromisso ou a resolução de algum problema.
Eu me sentara numa poltrona, e ele sentou-se a minha frente, olhou-me, reparou que estava folheando e lendo seu próprio livro, sorriu e pediu que eu continuasse... Sorriu, se deteve alguns momentos na minha expressão, e interviu: "Fique aqui, por favor, lhe peço. Sairei e daqui a algum tempo eu retorno, problemas de maior urgência... minha querida...".
Eu fiz que sim com a cabeça, ele se aproximou, me deu um beijo na testa, como era peculiar a sua pessoa, e saiu.
Tanto a sua presença, quanto a sua ausência, sempre me deixaram à vontade para estar e ser... Seus amigos e amigas, os mais íntimos compartilhavam os livros, a música, um pouco de tudo. Havia comigo um outro particular, mais declarado e sensível.
O lugar de alguém na vida de alguém, a lembrança desta passagem, a eficiência e a delicadeza do significado relativo a nossa presença neste endereço paralelo, o outro.
GIKOVATE esteve em mim desde sempre, insuspeitadamente algumas vezes, em outras, declaradamente. Não havia nada em mim que demandasse a necessidade dele, nem que sua presença fosse conveniente a um propósito. Eu confiava na leitura que fizera a partir dele, na escuta de suas palavras, no trânsito fecundo da emoção, sensação, sentimento, intuição, coerência...
Não me apetecia querer algo, procurar por algo, simplesmente representar, através deste meu lugar e espaço, a certeza de que a existência dele produzira muitas coisas boas, e a honestidade de seu caráter eram signos de tranquilidade e paz.



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