A COMPOSIÇÃO DO BEIJO (01) - DENISE FRANÇA

Curitiba, 14 de junho de 2012.

'ENSAIO DE LUZES": TEXTO DEDICADO AO DOUTOR FLÁVIO GIKOVATE.

PRIMEIRA INSPIRAÇÃO: AZUL

Estou lendo os textos do Doutor Flavio Gikovate há algum tempo, e percebo a semelhança do pensamento  e observações a respeito da vida, parecidos com o que eu percebo e vejo... Raridade, e autenticidade, coerência, sensatez, capacidade de visualizar as coisas que virão a partir de ontem, hoje, possíveis e impossíveis. Assim nasceu este ENSAIO DE LUZES, de um beijo numa séria colocação humana, o sujeito em sua vida, questão que se admite, elaboração conceitual, significado, nada fortuito, ou jogado sem este chão da escuta, leitura, partilha. ENSAIO DE LUZES, é poesia, porque precisa da composição, é técnica, é sentido. ENSAIO DE LUZES, TEM DEDICATÓRIA, É A ELE MESMO: FLAVIO GIKOVATE. Qualquer semelhança com fatos ou outras pessoas, é mera coincidência...´E acima de tudo, suportabilidade para escutar, ler e reler, capturar o sujeito e sua vida. E este EU que faz a narração, pode ao contrário, suportar este não sentido e imprevisível, não se trata do meu EU, este que se fez. 
Produção é isto. Não conheço outra produção, e é com o MAIOR RESPEITO, que garanto e autentifico e certifico tudo isto que aqui escrevo, em sua homenagem.  Porque eu acredito que as pessoas devam ser homenageadas não pela VAIDADE e status que representam,  mas pela ruptura desta maleabilidade ordinária da mesmice, para uma possibilidade de outra coisa. 

A coragem não lhe falta, assim como a TERNURA. 

 "ENSAIO DE LUZES" é uma ficção, aperetivo daqueles de entrada, em companhia de alguém com quem se espera estreitar os laços. Mais do que isso, é um jantar a luz de velas, em companhia do Gikovate. Uma forma de AGRADECIMENTO a uma pessoa que eu não conheço, faço questão de frisar isso: NÃO CONHEÇO FLÁVIO GIKOVATE, NENHUMA INTIMIDADE COM ELE, SEQUER O VI PESSOALMENTE. O friso está feito, e mesmo diante DISTO, o carinho e admiração pela SUA OBRA,  que me traz bem estar, por tudo aquilo que acarreta. 

Começa assim:

"A mesa que ele escolheu é uma mesa de canto, um pequeno restaurante, quase um café. O Doutor Flavio Gikovate está sentado, a minha espera, não está ansioso por minha chegada, simplesmente me aguarda e olha através da janela. Hoje ele resolveu chegar bem antes do previsto, porque lhe deu vontade de esperar mais tempo, e portanto, utilizar estes instantes para contemplar seus próprios pensamentos. Um homem maduro, todos o conhecem, carismático, antenado, concorre com todas as verdades, navega nos mares e horizontes, atravessou tempestades...

A tarde começa a cair, são 19:00hs, Gikovate sentado à mesa, pede ao garçon água. Água com gás, sem gelo. Não pensa em mim mais do que a uma amiga, absorve o ambiente, a luz, o silêncio, um casal sentado em outra mesa mais distante. Recupera novamente sua imagem na janela, atravessa essa imagem e vê a luz do luar. Linda noite. Gikovate não me acha uma mulher linda, exuberante, apenas recupera o sentimento e o significado de um encontro, neste momento.

Lá fora ele observa pessoas cruzando as ruas, o imediato, e o material. Não lhe causa mal-estar admitir o mundo e seus ruídos, constata o sujeito humano em cada detalhe, no entalhe da voz, a expressão do rosto, a emoção de querer, de não-saber, a identidade de um confesso, o layout da vida...

Quando entrei, logo o vi, ali naquele canto, e fiquei sorrindo ao reconhecê-lo. E sorrindo eu fui ao seu encontro, e o vi olhando o flagrante das horas, através de  tudo.

Ele então se voltou, levantou-se, segurou minha mão, disse oi. Oi, Gikovate. Tenha a bondade, com estas palavras e a mão voltando-se para o lugar a sua frente, ele disse: sente-se menina. 

Eu me sentei, e ficamos os dois, um olhando os olhos do outro, por alguns momentos. Não foram efêmeros instantes, foram declaradamente os melhores, de muitos. Olhei seus cabelos, olhei a circunvizinhança de algumas mechas, uma lembrança remota me veio a mente, um romano... E eu então sorri novamente por causa disto. Ele retribuiu meu sorriso como um afago, me perguntou qual o motivo deste sorriso. Eu disse: os romanos, e os nós-borromeus. E ele retrucou: nós, somos nós. 

A intimidade, a nossa intimidade se comprazia em revelar que eu estava em companhia de um homem muito conhecido, absolutamente conhecido, e este era o nosso primeiro momento, o de olhar e ver. Enquanto começávamos a conversar, ele me olhava, e colocava as mãos depositadas na mesa, uma sobre a outra, e eu conversava com ele, sorrindo, os cotovelos depositados em cima da mesa, descansando o queixo sobre as mãos.... 

Navegava no uniforme, e me enamorava de sua gola cacharrel preta, de suas mãos sensíveis e rápidas de escritor, do seu punho, aguçado e preciso. 

E ele falava sobre tudo, pairava na névoa sobre lagos difusos, e eu aos poucos adormecia naquela figura humana de um homem espontâneo, tranquilo, versátil, feliz...

O vinho, excelente, vinho tinto seco. O cálice socorria um momento de alerta, e um momento de emoção, jamais vaidade... E ele sorvia o gosto do vinho, enquanto eu olhava seus lábios, e pensava no beijo abstrato do quadro recém terminado de um pintor... Estilo.

Gikovate de repente: movimentou sua mão ao redor das minhas, e segurou minha mão esquerda, virou a palma para cima e tocou com sua mão o centro da minha, assim fez e olhou meus olhos, para entender e sentir minha resposta. 

Eu não recuei, porque sabia que era assim, e assim seria. Mais além do que eu via no olhar dele, a realidade de um amanhecer entre e para nós dois. Gikovate se comprometia espontaneamente com aquele encontro, sem reservas, sem falsas promessas, sem nenhum tipo de artifício, senão o proveito de um encontro vivido.

Conversávamos, ele falava, eu escutava atentamente. Ora seu olhar se movimentava no alinhamento do meu rosto, outras vezes do meu corpo, e inúmeras vezes, de tudo um pouco, formando uma composição do meu perfil,  uma composição acerca dos desafios.



 




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