O CIÚME - DENISE FRANÇA

Curitiba, 19 de outubro de 2012.

COMENTÁRIO EM RELAÇÃO AO TEXTO DO DOUTOR FLÁVIO GIKOVATE: O CIÚME SENTIMENTAL...

Eu diria que na relação a dois, não existe ciúme. O ciúme é derivado de um terceiro elemento...

Inevitavelmente, pelo estado próprio do encantamento amoroso que confere um lugar especial ao outro, particular e único, tudo aquilo que vem do exterior em desencontro a isso, é percebido como risco ao relacionamento.

Não queremos perder esse l ugar, ou não temos capacidade de amar de outra maneira?! Fora da relação, olhando de fora, observamos que não há nada de tão particular ou especial em ambos, as pessoas que formam o casal, para que sejam vistos como "únicos" e ou "especiais".

Nesse sentido, podemos afirmar que o "amor" abre um espaço novo, produz uma linguagem particular entre os enamorados, um OUTRO DISCURSO, que só eles compreendem.

FREUD em sua obra, chamou esse fator de "TRANSFERÊNCIA", e significou esse conceito como sendo um dos conceitos fundamentais da PSICANÁLISE; senão o "conceito" por excelência que caracteriza o início da psicanálise.

Foi em razão do comportamento "particular" observado em suas pacientes, que Freud começou a pontuar o processo psicanalítico. Mas o mais interessante é que Freud determinou esse elemento, a "transferência" como ponto de "RESISTÊNCIA", entrave ao processo da cura.

LACAN, da mesma forma, posteriormente, falando sobre a "ÉTICA" em psicanálise, trouxe no decorrer da leitura das obras dos filósofos gregos, o que era o AMOR... Em O BANQUETE, de Platão, fala sobre o amor entre os gregos... O AMOR AO SABER, o desejo de saber, e a figura do analista... Deste ponto ele parte para elucidar esse elemento particular, a transferência, ou seja, o paciente se sente apaixonado pelo psicanalista..., transfere um quantum de afeto... Depois, Lacan faz a leitura de KANT  com SADE, para ir um pouco mais longe dentro deste conceito e especificar as condutas masoquistas, os pares de oposição que regem a conduta humana.

"O ENCANTAMENTO AMOROSO" acontece ao longo da história, da cultura, em todos os tempos, a todo momento, e caracteriza o ser-humano por excelência.

A RESISTÊNCIA a que Freud se referia e que abre à transferência, mais tarde é entendida como proveniente das primeiras identificações parentais da criança. E se questiona se o amor só se dá sob esse aspecto e condições...

LACAN persegue alguma coisa a mais, diante da metáfora paterna, que contornaria a relação da criança e da mãe, e colocaria este sujeito mais adiante, além destas identificações parentais.... O terceiro elemento, o PAI.  POR ISSO, deixa o aspecto IMAGINÁRIO, as imagos infantis, e prossegue com a metáfora paterna, ou seja a razão funcional do LUGAR DO PAI, nesta relação mãe-filho. O lugar do pai, entendido como aquele que causa a interdição, e proclama a LEI.... O que pode ou não pode ser feito...

Se procuramos no outro, objeto do nosso amor por características já conhecidas em nossa história particular e pessoal, isso é certo.  Buscamos "repetir" o mesmo fenômeno, o mesmo modelo e funcionamento... Daí nasce mais um dos pilares da Psicanálise, o conceito de "REPETIÇÃO"...  E a resistência do sujeito ao processo de cura, por debaixo da DEMANDA QUE O SINTOMA NOS OFERECE... O SINTOMA DO SUJEITO É UM SINAL, indica a direção, o caminho....

Mediante a renúncia a esse lugar, do infante, chegamos a uma outra postura que nos permite AMAR MELHOR.

O CIÚME é derivado das primeiras experiências no seio familiar, quando nos deparamos com um outro irmãozinho, e perdemos o privilégio do nosso lugar anterior. As atenções são divididas, e isso pesa sobre a nossa vaidade pessoal.

Esse vetor "IMAGINÁRIO" que caracteriza a natureza deste amor, é a nossa "imagem" (EGO), que se subdivide em ego-ideal, e ideal-do-ego.   Esta imagem construída paulatinamente através do quantum afetivo, emocional depositado sobre a vulnerabilidade do nosso ser infante.

E, se não bastasse, outros sentimento, emoções negativas, inveja, ciúme, são derivados disso. A privação deste afeto, em razão de um comportamento nosso que não  vai de encontro à autoridade do outro, nos deixa "rebaixados", tristes, invejosos, ciumentos, enfim...

 E, indiscutivelmente, na esfera de todas as nossas relações sociais, familiares, a cultura de um modo geral gira em torno deste funcionamento. E além disso, o afeto manifestado em forma de "carinho", palavras, atitudes positivas, ganha lugar como "presentes", "ofertas" que representem esse benefício infantil, a consolidação deste lugar junto ao outro.

Amamos melhor na medida que vivemos, conseguimos suportar as frustrações, conseguimos avaliar melhor o sentido de tudo isso e compreender que o outro não nos pode dar ou trazer felicidade. E o bem-estar proveniente de uma relação amorosa satisfatória advém de sair deste lugar privilegiado, imaginário, e assumir com responsabilidade que o "melhor" vem do respeito pelo espaço do outro, sua personalidade que caracteriza sua individualidade. Quanto mais aceitamos e nos conduzimos como pessoas precárias no desenvolvimento, não nascemos prontos ou acabados, mais conseguimos valorizar o outro, seu universo.

Isso não é utópico, é o que nos resta fazer para sairmos dos ENGÔDOS e armadilhas imaginárias.

Desta forma podemos entender O CIÚME como uma "CICATRIZ IMAGINÁRIA", que volta sempre a "enfernizar"....

Sabemos que o ciúme reduz o círculo de contatos do sujeito. O ciúme caracteriza uma postura arbitrária, autoritária, possessiva... Consequentemente e ao contrário, uma vida saudável se dá mediante o direito de ir e vir, estar em contato com  o mundo, descobrindo outras pessoas, se renovando a partir de outras possibilidades existentes, e avaliando outros modos de gostar, estar, se expressar.



DOUTOR FLÁVIO GIKOVATE


NO MEU PONTO DE VISTA, essa conduta caracteriza a possibilidade de um relacionamento amoroso saudável, maduro...., com bem menos ciúme.

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