O MEU MODO DE SER-MULHER - DENISE FRANÇA


Curitiba, 08 de março de 2013.


Eu gosto de ser mulher.  Nenhuma coroa de louros, de prata, de ouro me cabe. Só os cabelos soltos.
São os cabelos soltos e o chão de barro que constituem a minha meninice... ou, a minha molequice.... Eu era uma menina de cabelos curtos, meu pai não deixava que os meus cabelos crescessem.... Mas, eu corria, jogava futebol, andava descalça, subia em árvores, brincava com os bichos, e me sentia uma menina com vastos cabelos compridos, alados.
A minha infância nunca deixou de existir, mesmo mulher sou exatamente aquela pessoinha magra, aparentemente frágil, sentada em cima do telhado, olhando e observando o fragmento das horas.
Eu fazia parte do grupo dos meninos, eles aceitavam minha companhia, e logo cedo aprendi a viver em companhia de meninos e homens, sem medo, sem divergências.  Não sentia inveja dos meninos, eu me tornei amiga, e companheira.
Aos poucos, fui atingindo a adolescência, e as coisas se tornaram mais difíceis, porque comecei a ver os meninos com outros olhos, além dos de amizade. O primeiro beijo que dei em um menino, na hora do pai-nosso, foi prova de toda minha ousadia e amor... O que me custou um grande castigo em sala de aula, na frente de todos.
Eu gostei e ele gostou do beijo. E nos encontrávamos escondidos embaixo do palco construído para as festas da escola.  E assim seguiu a minha pré-adolescência, com namoricos, com muito estudo, gostava de estudar, e com a sensação de um grande amor por acontecer.
Sempre acontecia um grande amor em  minha vida. Era grande ainda mais, porque eu não podia namorar, meu pai não deixava.... E aos poucos traduzia toda a angústia de amar, em páginas, em cores, em desenhos...  Aos poucos eu me tornava um escritora, e aos poucos eu desenhava o modo e o mundo, o i-mundo, e o mudo silêncio da espera, até olhar os olhos do amor, o toque do amor, a vontade de ficar.
Engraçado, eu tinha noção das coisas que sentia, assim como tinha noção do que a outra pessoa sentia, e levava tudo isso muito a sério. O amor para mim sempre foi uma coisa séria. E a minha característica desde pequena era a amizade, a lealdade, e o amor...
Fui me tornando de alguma maneira diferente de muitas amigas.  Eu não compreendia o amor da mesma forma que elas compreendiam. O amor não ficava em mim, não parava em mim, ele se transformava e se estendia as demais pessoas, eu não era egoísta.
Era uma dor muito grande quando o menino que eu amava ia embora... Mas eu aceitava e continuava a vida de menina-moça. As ideias de casamento também não faziam parte da minha pessoa, porém eu era coerente com o que pensava e sentia. Sempre fui coerente e honesta com os meus sentimentos e consequentemente, com as pessoas ao meu redor.
Inexplicavelmente eu também era sozinha. Existia uma solidão dentro de mim tão grande que me apertava o peito. Hoje eu sei porquê sou sozinha.
Eu me construí e me desconstruí, para me tornar o que sou atualmente, enquanto mulher. Não comungo de muitas ideias e pensamentos que vigem na cabeça de grande parte das mulheres. Eu sou a mulher que sou, e não preciso e nem quero formar um grupo de mulheres para me fortalecer.
Acima do fato de ser-mulher, existe em mim a condição humana, maior e mais intensa. Todas as coisas que faço desde o momento em que acordo, até a hora de dormir, são e constituem o meu  ser, e o meu ser-mulher.
Eu sei que por muito tempo ainda fiquei com medo de viver este ser, e tentei seguir e ir em direção ao mesmo destino de muitas mulheres... Mas a vida não quis assim, outras direções e caminhos se abriram, outros horizontes, que me proporcionaram ver o mundo de outra forma, e desejar de uma maneira diferente a minha postura e condição de mulher.
Delas, as outras mulheres, eu não posso falar, porque é elas que devem falar de si mesmas. Eu apenas posso falar de mim enquanto mulher, e da minha vida, do que vivi e do que sou, o que foi, o que é, o que está sendo.
O homem em minha vida, sempre foi em primeiro lugar, algo gostoso e bom.  Eu gosto de amar, e a minha vida seria imensamente sem sentido e sem graça se não existisse esse amor ao homem.  Porém, a minha vida, e isto eu aprendi, não depende do homem, deste ou daquele, a minha vida depende apenas de mim mesma, e das coisas que faço, o que penso, o que sou. O homem é um ser que faz a diferença, que me possibilita as sensações de prazer, de aconchego, de amizade, ternura, cuidado, o que sinto e, ou o que possa sentir.
Os homens na minha vida não existem mais no campo da necessidade, como um elemento lógico que devesse estar acoplado ao meu ser.  Eu amo os homens, e antes de tudo, respeito o ser do homem, o masculino.
Hoje, não tenho dúvida alguma, não há nada assim tão bom e tão gostoso, quanto a companhia de um homem-amado. Não há nada assim tão lindo e maravilhoso quanto experimentar a ventura de um grande amor, e todas as sensações e sentimentos e  produtos derivados desta convivência.
O amor estagnado, precário, óbvio, o mesmo amor, não cabe em minha vida. Acho possível uma felicidade ao lado de um homem derivada de muitos outros fatores, bem além da mesmice. Isso não quer dizer alcançar coisas absurdas, muito pelo contrário, eu acho que é o bem-estar comigo mesma, a minha capacidade de viver sozinha, a minha compreensão de mim mesma e do mundo, que me possibilita amar um homem em plenitude de espírito.
E, falando em espírito, existe em mim, desde a minha meninice até os dias de hoje, um sexto-sentido que me guia e me coloca aonde devo estar, ao encontro de pessoas inusitadas. E existe também em minha vida, e sempre existiu, uma PRESENÇA indiscutível que jamais se separou de mim em momento algum, a esta presença, não preciso nomear, ou explicar. Simplesmente existe.
Eu gosto do meu corpo de mulher, do meu jeito de ser-mulher, e sinto que estou dentro deste ser-mulher, localizada e apreensível como uma luva, sem medo de viver, e sem medo de amar....



E TUDO ISSO É MUITO GOSTOSO!














Comentários

  1. Denise muito boa sua fora de encarar a vida, de se aceitar, respeitar e acima de tudo não querer pertencer, apenas ser :D

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